[Por] Paulo Cantos. Escárnio, Troça, Ironia, Humor. [Por] Pedro Fel. Peste, Fome, Guerra, Morte. Tipografia Camões. Póvoa de Varzim. S.d. [1942-1945? ou 1934]. De 18,5x12 cm. Com 205, [vi] págs. Brochado. Ilustrado no texto com gravuras. Exemplar muito bem estimado, com picos de humidade no corte das folhas. Primeira e única edição muito rara. A Biblioteca Nacional apenas tem um exemplar. Livro de aforismos, antologia de ditos e temas sobre a personalidade, que subverte a leitura tradicional, colocando os textos em pé e contra pé, obrigando o leitor a rodar o livro à medida que lê. É um exemplo paradigmático da estética de Paulo de Cantos, muito importante para o estudo da tipografia modernista portuguesa. Nesta obra Cantos contrapõe os estados de «Riso» e «Siso» em quatro sub-capítulos, que estão assinalados à cabeça pela tintagem diferente do corte das folhas, a azul ultramarino, azul turquesa, branco e amarelo. Estes capítulos apresentam o escárnio contra a peste; a troça contra a fome; a ironia contra a guerra; e o humor contra a morte. Os processos de composição tipográfica e acabamentos de pormenor sublimam o confronto e a ambiguidade das temáticas, desafiando os limites da arbitrariedade da leitura com a viragem de página acrescida de mais um gesto rotativo do livro, tolhendo progressivamente a concentração do leitor. Este efeito, que consideramos ser uma provocação humorística, aplica algumas das ideias do ensaio de Henri Bergson sobre o riso, nomeadamente a ideia de mimese e paródia que vem do teatro de fantoches e do cartoon humorístico. Ao transformar o leitor num intérprete ou mesmo num performer, Cantos exponencia o livro como um mecanismo de repetição, um adereço do processo do riso, aspeto da representação dramática que se consolidou, também, no cinema mudo. Paulo José de Cantos (Lisboa, 1892 Lisboa, 1979) foi editor, bibliófilo, pedagogo e tipógrafo amador com um lugar particular na modernidade artística em Portugal, tendo escrito, desenhado e editado freneticamente, entre 1920 e 1960, cerca de 70 títulos, entre livros, manuais didáticos e opúsculos. Foi professor de liceu e autor de uma vasta obra editorial onde construiu um estilo explosivo e experimental. Os seus livros, embora em grande parte destinados a fins educacionais, transcendem a função de simples manuais escolares. A sua abordagem ao design gráfico combinava texto e imagem de forma inovadora, com ilustrações diagramáticas que não eram comuns nos materiais didáticos da época. Cantos navegou entre as vanguardas artísticas do início do século XX e o modernismo pedagógico, influenciado por movimentos como o neoplasticismo e a Bauhaus. O seu trabalho introduziu a modernidade no design de livros em Portugal, utilizando uma linguagem visual marcada pela simplificação e racionalidade. O reconhecimento da obra de Paulo de Cantos tem vindo a crescer significativamente desde a década de 1990, com a redescoberta do seu trabalho por designers, bibliófilos e académicos. O interesse pela sua produção tem sido impulsionado por exposições e estudos que destacam a sua inovação gráfica e pedagógica. Desde 2012, o atelier de design Barbara Says tem desempenhado um papel crucial na investigação e divulgação da sua obra, organizando iniciativas como as «Jornadas Cantianas» (2011-2013), que culminaram na publicação de «Livr-o-mem»; e um arquivo online que reúne o acervo da coleção de Paulo de Cantos. Outros marcos do reconhecimento de Cantos são uma exposição no Museu Gulbenkian em Paris em 2017 e a recente análise da sua obra na monografia «A Cantos Compendium: A Designer of Pedagogical Theories», confirmando-o como uma figura pioneira no design gráfico e na pedagogia visual. Ref.: Gomes, António Manuel Sucena Silveira. Ver e Ler - Paulo Cantos: Um Projeto Bio-Bibliográfico. Doutoramento em Arte Contemporânea, Colégio das Artes da Universidade de Coimbra, 2016. Pelayo, Raquel. Paulo de Cantos: Máquina de Ensinar Pelo Desenho. Repositório Universidade do Porto. 2014. Martins, Raquel. Paulo de Cantos: um editor à frente do seu tempo. Público. Lisboa. 2013. [em linha] Barbosa, Jorge. Paulo José de Cantos [13 de Março de 1892 - 9 De Abril De 1979] Uma Personalidade Erudita e Singular. Biblioteca Municipal Rocha Peixoto. Póvoa de Varzim. 2013. Arquivo Online Cantosverso.